sábado, 6 de abril de 2019

O desconcertante experimento de Milgram sobre o comportamento humano


Em 1962, 40 homens entre 20 e 50 anos participaram voluntariamente de uma pesquisa na Universidade de Yale, nos EUA, sobre a punição como método de aprendizagem. Em duplas, um dos participantes atuava como "professor", enquanto o outro fazia o papel de "aluno". Cada vez que o "aluno" errasse um exercício de memorização, o "professor" deveria lhe aplicar choques, que começavam em 15 volts e iam progressivamente a 450 volts.

Na medida em que os choques eram aplicados, o "aluno" gritava de dor, pedia para sair do experimento ou se silenciava. Porém, os "professores" invariavelmente eram ordenados a seguir com a pesquisa.
Apenas uma pequena percentagem interrompeu o experimento e deixou a sala. A grande maioria – 65% – continuou e chegou ao choque máximo, para surpresa do cientista político Stanley Milgram (1933-1984), que mais tarde se tornaria doutor em Psicologia Social. Ele buscava identificar a desistência dos "professores" como resposta recorrente, mas testemunhou uma relação de obediência a qualquer custo. Nenhum voluntário foi até o "aluno" verificar se ele estava bem.

Estudada por profissionais da psicologia até hoje e responsável por provocar reações desconcertantes cada vez que é apresentada, a pesquisa de Milgram pode ser conhecida com detalhes no filme O Experimento de Milgram (2015). A obra está mais interessada em promover uma reflexão acessível do que optar pelo sensacionalismo que os resultados da experiência poderiam suscitar. 

"Uma das contribuições básicas do Milgram é que ele não pergunta às pessoas o que elas fariam dada essa situação hipotética; ele as coloca na situação". Após terminar a experiência, Milgram se apresentava aos voluntários e revelava o propósito real da pesquisa. O "aluno", que na verdade era um cúmplice do pesquisador, jamais levara choques. O único castigo aplicado de fato era no "professor", de 45 volts, para que ele tivesse ideia da intensidade da dor que infligiria no "aluno". O estudioso das relações humanas diversificou os testes, aplicando-o em mulheres, em outros países e inserindo pequenas mudanças no setting. Porém, a média de 65% dos participantes prosseguirem até o choque máximo sempre se manteve.


Nascido do Bronx e vindo de uma família judaica que fugiu dos horrores do nazismo, Milgram estava interessado nos aspectos mais obscuros da obediência. Pouco antes de seu experimento, em abril de 1961, Adolf Eichmann, responsável pela perseguição, sequestro e deportação de centenas de milhares de judeus para campos de concentração, foi levado a julgamento. Encontrado na Argentina, o ex-chefe da Seção de Assuntos Judeus no Departamento de Segurança de Hitler afirmou que estava apenas cumprindo ordens e que nunca tinha se preocupado em questioná-las. Ele foi condenado à morte e morreu no ano seguinte.

As descobertas de Milgram se atualizam especialmente perante situações em que as frases "estou apenas cumprindo ordens" e "não me responsabilizo pelas consequências" indicam a validação de comportamentos abusivos, violentos ou opressores. Quando semelhantes, e não monstros, demonstram ser capazes de realizar atos tão absurdos, intenções e idealizações caem por terra. A obediência à autoridade, e também o silêncio, são capazes de ensejar decisões atrozes. O experimento de Milgram reacende nossa possibilidade necessária de questionar ordens, especialmente aquelas que transgridem valores particulares.

 Francisco Facho nº8

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